quarta-feira, 8 de abril de 2009

Invenções, Criações e Maracutaias

Depois que o meu amigo "purtguêxs" (apenas uma licença poética, afim de dar ênfase ao sotaque), Speedster lembrou-me que Gordon Murray era o projetista da Brabham, isso me deu idéias para um post. Pois bem, Piquet (o pai, porque eu jamais chamaria o Nelson Angelo Piquet de "Nelsinho", apesar de saber que essa denominação foi usada para designar o seu pai no início da carreira em monopostos) e Murray INTERPRETARAM os regulamentos da época gerando inovações e invenções, sendo que algumas perduram até os dias de hoje. Como dizia Jack, o Estripador, vamos por partes:

O carro: Brabham BT49C.


Invenções, criações e Maracutaias:
Balanço de freio: foram eles que inventaram. Até aqueles longínquos tempos, não havia esse recurso. Quem nunca viu um F1 "fritar" apenas uma roda dianteira, de preferência aquela do mesmo lado da curva? Pois é, o piloto joga boa parte da carga dos freios para a parte dianteira do carro e a roda dianteira, do lado interno da curva, tende a sair do chão. Agradeçam ao Sr. Piquet ao Sr. Murray.

A distribuição dos freios é feita por meio daquela "borboletinha"
verde, situada à esquerda do volante circulada em branco. Aqui, na
Ferrari 641 de 1990, ao girar a "borboletinha" para a esquerda, mais carga
na traseira. E vice-versa.
Pit-Stop: diz Piquet que, quando Murray veio com a história de começar a fazer trocas de pneus durante a corrida, o mesmo Piquet disse: "só eles (pneus) estiverem quentes". Foi a semente das mantas de pré-aquecimento de pneus. Tem uma outra história que Piquet começou a levar cobertores (roupa de cama mesmo) dos hotéis para a pista, afim de manter os pneus aquecidos entre uma volta rápida e outra no qualifying ou após o alinhamento no grid. Mas essa prática era pré-Murray/Piquet. A grande sacada dos dois foi, não de manter os pneus aquecidos, mas esquentar um pneus que não tinham dado uma volta sequer. Aí nasceram as mantas elétricas.

Manutenção da temperatura dos pneus após o alinhamento no grid
com cobertores convencionais.

As modernas mantas elétricas.
Freios Refrigerados a água: é isso mesmo. Só que era mentira. Os freios da Brabham eram refrigerados a ar, como os de qualquer outro carro. Só que dupla Murray/Piquet "passaram a perna" no regulamento. A Brabham largava com pequeno tanque de água (20 litros) que supostamente serviria para refrigerar os freios durante a prova. Só que na primeira freada, o reservatório esvaziava-se por completo deixando o carro 20 kg mais leve. Como na pesagem, após a prova, era (não sei se ainda é) permitido repor os líquidos que foram perdidos durante a corrida (óleo, combustível, água ou óleo do sistema de arrefecimento do motor), e no caso dos freios da Brabham, inclusive o tal "tanquinho" d'água era enchido novamente, dando os 20 kg que faltavam para fechar o peso mínimo da época, que era de 580 kg. Então as Brabham corriam com o peso mínimo abaixo do regulamento (que foi devidamente "interpretado").
Suspensão Hidro-Pneumática: devido a gritante superioridade dos geniais carros-asa, a FISA resolveu tomar providências para que houvesse mais disputa e menos mortes nos circuitos, já que o carro-asa permitia altíssimas velocidades em curvas (e que os times da FOCA tivessem mais chance contra os fantásticos chassis ingleses). De primeira, a FISA resolveu que não permitiria as saias de polipropileno nas laterais dos carros (que era o grande segredo do sucesso deste projeto) e, desta maneira, o efeito-solo cairia por terra. As equipes bateram o pé e as saias foram mantidas. Porém a mesma FISA designou que a altura do fundo do carro ao solo fosse de, no mínimo, 6 cm. Parecia que a FISA havia conseguido proteger os times componentes da FOCA. Mas, nem de longe imaginaram o que um sul-africano chamado Gordon Murray faria ao interpretar (de novo??) o regulamento. Ao analisar as regras, Murray percebeu que a medida de 6 cm era ridícula e só poderia ser aferida com o carro parado, pois não havia, na época, como detectar a altura do carro em movimento e o próprio downforce, incrementado pelos aerofólios e pelo desenho do carro, fariam essa medida ir por água a baixo. Bem, se o carro estivesse mais baixo que os 6 cm, o efeito-solo seria mais pronunciado e as saias funcionariam. Deixar o carro mais baixo não era o problema (pelo downforce). O que estava rachando a cabeça de Murray era como devolver ao carro a altura prevista no regulamento, para as inspeções nos parques-fechados. Então, num "momento Eureka", Murray instalou em um determinado braço das suspensões dianteira e traseira, um pequeno pistão hidráulico. Quando o carro estivesse em repouso, os pistões manteriam a altura mínima. Por outro lado, quando o carro estivesse em movimento (a partir de uma determinada velocidade e consequente downforce), a pressão aerodinâmica se encarregava de esvaziar os pistões. O óleo ia para um reservatório que possuía uma certa pressão, sendo que a medida em que a velocidade e o downforce fosse diminuindo, o reservatório "empurrava" o óleo de volta ao pistões hidráulicos na suspensão. Simples, não é mesmo?


Crédito das ilustrações: gptotal.com.br

Mas ainda existia um problema: o equilíbrio entre as pressões era tão delicado que, quando o carro reduzia a sua velocidade (por exemplo, para entrar numa curva), este tendia a elevar-se, reduzindo o efeito solo devido à entrada de ar pelas saias, o que podia chegar a ser bastante perigoso. Novamente, Murray encontrou a solução para o problema, intercalando entre os pistões e o reservatório uma espécie de microfiltros, que fariam que o trânsito do óleo entre o pistão e o reservatório fosse mais "preguiçoso", suave. Com expressivas vitórias, o carro passou a chamar a atenção de todos (inclusive dos adversários) que quase copiaram de maneira idêntica a idéia de Murray. Eles não sabiam como fazer com que o trânsito de óleo pistão-reservatório fosse suave e natural. Recorreram a um botão que o próprio piloto acionava, bloqueando o tráfego de óleo pistão-reservatório. Mais uma vitória da Inteligência sobre a Força.


Da esquerda para a direita: Piquet, Murray e Patrese.
Rio Tire-test, 1981.

Um comentário:

  1. O Gordon Murray é de uma geração de génios que sabiam interpretar os regulamentos como ninguém, como Colin Chapman e Harvey Postlethwaite. E ainda por cima com uma tripla imbatível (Ecclestone-Murray-Piquet) deram dois títulos de pilotos á Brabham.


    E mesmo o seu maior fracasso, o BT55 Skate, de 1986, foi a base do mítico McLaren MP$/4, que apareceu dois anos depois e que ganhou tudo, com o Senna e o Prost.

    ResponderExcluir

Este é o momento mais gratificante do blog. Deixe seu comentário e faça um blogueiro feliz!